domingo, 2 de outubro de 2016

A cidade justa na República de Platão [ ... ]



INTRODUÇÃO 

Platão, discípulo de um dos maiores filósofos da cidade de Atenas, “Sócrates”, foi um dos homens que marcaram definitivamente a história ocidental, na qual, as ideias do seu pensamento, sua dedicação e força de vontade junto aos ensinamentos do seu mestre, conferiu-lhe um destaque na filosofia ocidental. Escreveu sobre uma variedade de assuntos, tais como política, estética, cosmologia e epistemologia. Suas ideias até hoje são tão interessantes que às vezes fazemos referencia ao “Amor Platônico e as Ideais Platônicos”.
Muito embora, seja conhecido como discípulo de Sócrates, Platão, foi muito influenciado por Pitágoras e outros pensadores. Após a morte do seu mestre, ele viajou por um período de 12 anos, estudando vários assuntos, incluindo, matemática com os pitagóricos na Itália, geometria e astronomia no Egito. Durante suas viagens, ele escreveu seus primeiros diálogos que destacaram Sócrates e seus ensinamentos. Neste sentido, sabemos que Sócrates não escrevia nada, e assim, seus diálogos representam um dos poucos perfis que se tem sobre o lendário filósofo e seu estilo de discurso.
Entretanto, quando Platão, regressa a Atenas, resolve fundar a Academia Platônica em 387 a.C, todavia, sua academia é considerada a primeira instituição de ensino superior do ocidente. Lá, os alunos podiam assistir aulas ao ar livre sobre astronomia, biologia, matemática, política e filosofia. E, enquanto ensinava na Academia, Platão continuava a escrever, finalizando então 35 diálogos e 13 cartas, conhecidas como Epístolas. Os relatos de historiadores afirmam que a ordem que Platão escrevia suas obras não é sabida ao certo, mas tradicionalmente reúnem seus trabalhos da seguinte forma: os primeiros diálogos que incluem “Apologia e o Críton” apresentam os ensinamentos do seu mestre; já os diálogos finais como a “República e o Simpósio”, introduzem a teoria das formas de Platão e a relação entre a alma, o estado e o universo. Finalmente seus trabalhos mais maduros são reunidos.
Não podemos deixar de frisar que Platão, defendia um homem novo e uma sociedade nova, porém justa e, o mesmo, motivou muitas pessoas a não se conformarem com os limites do dia a dia, “Senso comum”, mas lutar pelo ideal. Não obstante, viveu plenamente o acontecimento do seu tempo, dando valor àquilo que depois de um exame rigoroso, que a tradição lhe ofereceu, buscando na adversidade grega a superação.
Na Carta VII do livro “A Republica”, relata de uma forma clara que Platão não foi omisso com suas ideias, mas mostrou suas descobertas intelectuais da práxis política que não foi bem aceita na época. Muito embora seu pensamento se mostre criticado ainda nos termos políticos e nas leis, é de maneira especial a República, o lugar de reflexão deste ponto: Neste livro concentra seu empenho políticossocial com a luz de sua metafísica. A missão deste filósofo foi semelhante aquele prisioneiro libertado.
Contudo, o filósofo Platão expõe em forma de diálogo à metáfora “Mito da Caverna” no livro “A Republica” citando as contribuições de Sócrates junto a Gláucon, onde inicia gerando uma grande reflexão.
Platão representando seu mestre, afirma:
Imagine prisioneiros numa caverna, seus pés, pulsos e pescoços, estão acorrentados, de forma que eles não conseguem olhar para trás, apenas para a parede da caverna em sua frente. Suponhamos que atrás deles, exista uma fogueira e após a fogueira, exista a entrada da caverna e, nesta passam vários seres vivos. Agora, se um dos acorrentados consegue se libertar. Ele sairá da caverna e verá a luz do sol, ou seja, perceberá que vivia num mundo das aparências. Assim, ele estará liberto e contemplará o mundo inteligível e ao retornar com nova visão, tenta convencer seus amigos que eles vivem no mundo das aparências e os mesmos não acreditarão, pois eles passaram a vida inteira acreditando que as sombras refletidas na parede da caverna representa a verdade (PLATÃO, República, VII, 514b).
Neste cenário, o Livro VII “A Republica” descreve de forma ampla, porém dinâmica, baseando-se na liberdade do ser humano conhecer meios para atingir a absoluta razão dualista, ou seja, o mundo sensível e inteligível e tendo como principal foco, estratégias ético-político no meio social. Para Platão:
O mundo fora da caverna representa o mundo verdadeiro (real), o mundo inteligível, por possuir formas ou ideias que guardam consigo uma identidade indestrutível garantido, o conhecimento dos seres sensíveis. O inteligível é o reino das matemáticas que são o modo como aprendemos o mundo e construímos o saber humano. A volta na caverna é à vontade ou obrigação moral que o homem esclarecido tem de ajudar os seus semelhantes à saírem do mundo da inocência e do mal para construírem um mundo mais justo com sabedoria. O brilho do sol representa a ideia suprema de bem, ente supremo que governa o inteligível, permite ao homem conhecer e de onde deriva toda a realidade. Logo, a metáfora”, ‘Mito da Caverna’, é uma forma de contar de maneira ilustrada o que conceitualmente os homens teriam dificuldade para entender, já que pela própria narração, o homem sábio nem sempre se faz saber pela maioria das pessoas ignorantes. (PLATÃO, República, VII, 517c).
Partindo da metáfora “Mito da Caverna ou Alegoria da Caverna”, Platão resolve construir sua ideia perfeita de cidade justa no seu livro “A Republica”, onde discorreu a cerca da constituição de um estado pleno, buscando superar a crise provocada pelos tiranos.  Portanto, este livro definirá com clareza os pontos básicos e apresentará a solução, muitas vezes radicalizando-a. Ele afirma que como a alma do ser humano deve ser absolutamente única, da mesma forma é o estado, pois deverá estar unificado em classes de forma justa.  Muito embora, cada classe ou parte possua uma função específica, isto jamais deverá ser motivo de divisão, porém, concorrer para a unidade.
Por conseguinte, o tema, Cidade Justa na República de Platão, foi escolhido devido o prazer pela leitura feita do livro desse filósofo “A República”, dai, surgiu o interesse. Este livro apresenta várias teorias baseadas na justiça, visando à felicidade dos membros da mesma, sejam agricultores, guardiões ou administradores. No mais, faz harmonia entre as partes da alma do homem e as partes das atribuições de cada membro do estado, e certamente se encaixa direitinho na produção da monografia proposta pelos nossos orientadores da Universidade Federal do Piauí – UFPI, pois os mesmos, propuseram que a monografia do término do curso de licenciatura em filosofia fosse referente à justiça ou política.
Ressaltamos que é essencial voltarmos por meio de leituras no livro “A República” desse autor clássico, pois apesar de ser muito estudado acreditamos que sempre numa nova leitura aprende-se algo novo, ou seja, um novo olhar acerca das questões discutidas por Platão. Logo, nosso objetivo é analisar a obra de Platão, com interesse de assimilar suas teorias políticas e enriquecer nosso trabalho que por sinal, será muito útil para os futuros estudantes.
O primeiro capítulo vai tratar sobre a Concepção de alma para Platão e as Implicações para Teoria Política, identificando as três partes da alma humana (concupiscível, irascível e racional), na qual estas partes estão relacionadas com as aptidões inerentes do ser humano (homem) harmoniosamente com o estado, ou seja, através destas partes é que se gera o agricultor, artesão e sapateiro que a cidade realmente necessita; o guardião para proteger a cidade por meio de sua coragem e por fim, o gestor para administrar a cidade com sabedoria.
 No contexto deste, abordaremos as teorias sobre a justiça na construção do estado ideal, desejando descobrir de maneira plena, o conceito “Justiça”, mas uma justiça que seja perfeita e que não tenha exceção, ou melhor, que seja absoluta, é que gere a felicidade para o administrador, para o guardião, e para o povo e ainda, as tentativas de educar Dionísio II para formar o governo justo em Siracura.
No segundo capítulo discutiremos sobre as Ideias da Justiça e do Bem em Platão e dentro do contexto, educação e valores da cidadania e por fim, a justiça na República de Platão. Para tanto, essas ideias supracitadas que percebemos de forma clara que o sentimento de justiça é, pois, a virtude maior cujo valor ético guia as condutas dos homens. Para que esta virtude seja alcançada, o homem deve buscar o bem em si próprio, porque ele realiza o ideal de justiça, tanto com relação ao bem individual quanto social. Ressaltamos que ética platônica ocupa-se com o correto modo de agir e sua relação com o alcance da felicidade.
Contudo, o discurso ético apresentado na República acerca da felicidade relaciona esta com o conceito de justiça. Seria injusto deixar de dar ênfase que o problema da justiça enquadra-se no âmbito político, no qual tem estreita relação com o campo da ética: é deste modo que surge a tese central de que só o justo é feliz.

1. A concepção de alma para Platão e suas implicações para sua teoria política.

Nossa tarefa agora, se concentra em entender o que o filósofo Platão afirma acerca das almas, que para ele, elas (almas) “são divinas e imortais e estas se alimentam da sabedoria, de intelecção, do saber sem mistura” (PLATÃO, República, X, 620e - 621c). Portanto, as almas que se alimentaram mesmo minimamente de realidade das ideias, têm maior possibilidade de atingir a unidade, a essência, através da reflexão, a alma que passou mais longe deste alimento tem maior dificuldade. Sendo assim, o que é compreensível a partir do exposto, é que o conceito denominado teoria do conhecimento consiste na conexão entre a maiêutica socrática e a reflexão daquele que é instigado por ela.
Chegamos ao convencimento do que poderia ser denominada “teoria da reminiscência”, pois, segundo a fórmula platônica, somente o estímulo certo pode desenvolver toda a potencialidade da alma do indivíduo, levando-o pela reflexão a resgatar as lembranças da existência passada. Desta maneira, o membro da República, saberia qual o seu lugar como cidadão e qual seu lugar na cidade ideal, tornando-se um homem justo por nela aceitar o lugar devido, sendo, portanto, conhecedor de seu potencial.
E assim, nasce um questionamento: como encontrar essa potência individual? Bergson, interpretando as ideias de Platão, responde, “descobrir o saber anterior, só é possível por meio da reminiscência, onde somente o detentor dos conhecimentos pode determinar seu potencial” (BERGSON, 2005, p. 111). Nesse elo, é realizado o jogo de perguntas e respostas, denominado maiêutica socrática estabelecida pelo filósofo Platão, por meio do personagem Sócrates, na República. Todavia, por meio da maiêutica, os interlocutores do personagem são levados a aprofundar os temas propostos na discussão, questionando suas próprias opiniões, para atingir, dessa forma, seus saberes prévios, uns atingindo conhecimentos mais profundos e próximos às ideias em si, outros, atingindo conhecimentos inferiores, de acordo com a própria experiência da alma, anterior à ligação ao corpo.
Sobre a reminiscência, afirma Bergson:
O que é a reminiscência? Ele responde, a alma viveu outrora no mundo inteligível. Lá, contemplava, via as Ideias, intuía-as (estado passivo). Caiu em um corpo, mas resta-lhe a lembrança daquilo que outrora contemplou. As coisas sensíveis, assim, despertam lembranças em nós. [...] a reminiscência fica a meio caminho entre a ciência e a ignorância (BERGSON, 2005, p. 111).
De certo, este é o caminho explicado pelos mitos para justificar saberes diferentes entre os homens e a profundidade dos conhecimentos adquiridos, ou seja, o filósofo mostra a diversidade dos homens e das experiências por eles vividas, justificativa lógica para os vários lugares da cidade ideal, os vários patamares de conhecimento e experiências.
No contexto acima, nota-se que Platão assim como seu mestre (Sócrates), deixam claro que o filósofo não ensina, mas faz relembrar as experiências passadas da alma. Porém, a recordação ou a reminiscência somente é possível pela reflexão do interlocutor no diálogo com o filósofo, pois, se não há conhecimento profundo na alma, também não há o que se atingir pela reminiscência. O ritmo do diálogo em Sócrates presente nas obras de Platão depende do conhecimento prévio do interlocutor e de sua alma. Logo, dessa maneira, a análise sobre os elementos que estão na República do filósofo Platão, afirmando que as experiências das almas dos homens que compõem a cidade são determinantes para a formação da cidade ideal, tendo por base o cumprimento da justiça entre os concidadãos e o entendimento dos espaços a serem ocupados no grupo social do qual fazem parte, enfim.
Portanto, podemos frisar no contexto acima que, Platão defende a tese do inatismo (reminiscência) da razão ou das ideias verdadeiras em várias de suas obras, mas as passagens mais conhecidas se encontram nos diálogos Mênon e a República. No Mênon, Platão dialoga com um jovem escravo analfabeto, fazendo-lhe perguntas certas na hora certa, o filósofo consegue ver que o jovem escravo demonstra sozinho um difícil teorema de geometria (o teorema de Pitágoras). As verdades matemáticas vão surgindo no espírito do escravo à medida que Platão vai-lhe fazendo perguntas e vai raciocinando com ele. Como isso seria possível, indaga Platão, se o escravo não houvesse nascido com a razão e com os princípios da racionalidade? Como dizer que conseguiu demonstrar o teorema por um aprendizado vindo da experiência, se ele jamais ouviu falar de geometria?
Contudo, em A República, Platão desenvolve uma teoria que já foi esboçada no Mênon: a teoria da reminiscência. Nascemos com a razão e as ideias verdadeiras, e a filosofia nada mais faz do que nos relembrar essas ideias. Platão é um grande escritor e usa em seus escritos um procedimento literário que o auxilia a expor as teorias muito difíceis. Assim, para explicar a teoria da reminiscência, Platão no livro X de A República, narra o mito de Er. O soldado Er, da região da Panfília, morreu e foi levado para o reino dos mortos, e chegando lá, encontra as almas dos heróis gregos, de governantes, de artistas, de seus antepassados e amigos. Ali, as almas contemplam a verdade e possuem o conhecimento verdadeiro. Er, fica sabendo que todas as almas renascem em outras vidas para se purificarem de seus erros passados até que não precisem mais voltar à Terra, permanecendo na eternidade. Antes de voltar ao nosso mundo, às almas podem escolher a nova vida que terão. Algumas escolhem a vida de rei, outras de guerreiro, outras de comerciante rico, outras de artista, de sábio (PLATÃO, A República, X, 614b – 618a).
Portanto, no caminho de retorno à Terra, as almas atravessam uma grande planície por onde corre um rio, o Lethé (que, em grego, quer dizer esquecimento), e bebem de suas águas. As que bebem muita água esquecem toda a verdade que contemplaram; as almas que bebem pouca água quase não se esquecem do que conheceram. As que escolheram vidas de rei, de guerreiro ou de comerciante rico são as que mais bebem das águas do esquecimento; as que escolheram a sabedoria são as que menos bebem. Assim, as primeiras dificilmente (talvez nunca) se lembrarão, na nova vida, da verdade que conheceram, enquanto as outras serão capazes de lembrar e ter sabedoria, usando a razão. Conhecer, diz Platão, é recordar a verdade que já existe em nós; é despertar a razão para que ela se exerça por si mesma. Por isso, Sócrates fazia perguntas, pois, através delas, as pessoas poderiam lembrar-se da verdade e do uso da razão. Se não nascêssemos com a razão e com a verdade, indaga Platão, como saberíamos que temos uma ideia verdadeira ao encontrá-la? Como poderíamos distinguir o verdadeiro do falso, se não nascêssemos conhecendo essa diferença?
Portanto, faz-se necessário ressaltar que a teoria da reminiscência possui uma relação com a teoria política no sentido de recordação das ideias gregas, pois dessa forma, o cidadão da República saberia qual posição deveria ocupar como cidadão e qual o seu lugar na cidade ideal, tornando-se um homem justo por nela aceitar o lugar devido, sendo, portanto, conhecedor de seu potencial.
Contudo, sabendo do seu potencial, o administrador da cidade deve ser o modelo das virtudes para a comunidade, pois ele o imitará. De certo, os pensadores viram-se entre duas teorias: “a platônica, que pretendia chegar à política legítima e justa educando virtuosamente os governantes”; e “a aristotélica, que pretendia chegar à política legítima e justa propondo qualidades positivas para as instituições da cidade, das quais dependiam as virtudes dos cidadãos”. Entre as duas, os gregos escolheram a platônica, mas tenderam a dar menor importância à organização política da sociedade (as três classes platônicas) e maior importância à formação do administrador virtuoso.
Certamente, o administrador como todo ser humano, é racional, mas, diferentemente dos outros humanos, não poderá deixar-se levar pelas paixões, mas apenas à razão. Por isso, deve ser educado para possuir um conjunto de virtudes que são próprias do governante justo.
Para tanto, o verdadeiro administrador é aquele que nunca se deixa levar por paixões que o transforme numa besta. Não pode ter a violência do leão nem a astúcia da raposa, mas deve, em todas as circunstâncias, comportar-se como homem dotado de vontade racional. O homem será o Bom Governo se for um Bom Conselheiro, isto é, sábio, devendo buscar o amor e o respeito dos súditos.
Conclusão, a teoria do Bom Governo ou Administrador deposita na pessoa do governante a qualidade da política e faz de suas virtudes privadas, virtudes públicas. O bom Administrador reflete a comunidade e a espelha, sendo por ela imitado em suas virtudes (PLATÃO, República, X, 544c –547c).

1.1 Teorias sobre a justiça na construção do estado ideal

Pelas leituras feitas no Livro I de Platão, na República, podemos perceber que Sócrates estava em companhia de Gláucon quando o escravo de Polemarco pede Sócrates que espere, pois o seu Senhor desejara falar. Sócrates então questiona, onde está seu Senhor? O escravo apontou com o dedo aonde vinha. Sócrates e Gláucon viram distantes e esperaram. Polemarco chegou e convidou-os a sua casa, onde convenceu ambos para visitar o seu velho pai (Céfalo) e ainda, para comemorar as festividades da deusa Bêndis; na parte da tarde teria uma corrida de cavalo e a noite um jantar com a família e amigos, depois festa em homenagem a deusa. Sócrates e Gláucon aceitaram o convite,e, no meio do jantar, diante de tantos diálogos férteis de sabedoria, nasceu uma ideia de justiça no momento em que Céfalo falava de sí para Sócrates. Foi nessa hora que Céfalo abriu a mente de todos os convidados presentes para tratar de tal tema.
A justiça na visão de Céfalo é: “Não ludibriar ninguém nem mentir, mesmo involuntariamente, nem ficar a dever sejam sacrifícios aos deuses, seja dinheiro a um homem, e depois partir para o além sem temer nada” (PLATÃO, República, I, 331b). Sócrates fez um elogio ao idoso sábio, contudo, notou que existe uma falha nessa ideia e ressaltou:
Suponhamos que se alguém recebesse armas de um amigo em perfeito juizo, e este tomado de loucura lhas reclamasse, toda agente diria que não se lhe deviam entregar e que não seria justo restitui-lhas, nem tampouco consentir de em dizer toda a verdade a um homem nesse estado. Portanto, não é essa a definição de justiça: dizer a verdade e restituir aquilo que se tomou (PLATÃO, República, I, 331d).
Depois, de se convencer por meio de Sócrates que sua ideia de justiça estava totalmente errônea, Céfalo se retira da discussão e deixa seu herdeiro prosseguir. Polemarco, então, ansioso, afirma que: “a justiça é ajudar os amigos e prejudicar os inimigos” (PLATÃO, República, I, 332d). Sócrates, afirma que:
Muitas às vezes, as pessoas que acreditamos ser amigas não são, e as pessoas que pensamos ser inimigas são amigas. Amigo é o que parece e é na realidade honesto; às vezes o que parece não é, aparenta ser amigo, sem ser. E sobre o inimigo, a definição é a mesma, ou seja, existem pessoas que acreditamos ser inimigas, mas nos enganamos - elas poderão nos provar o contrário, ou seja, se tornar amigas. Logo, parece que amigo é homem de bem e inimigo o malvado. Então, a justiça consistiria em princípio, em fazer o bem a amigos e a inimigos ao mesmo tempo (PLATÃO, República, I, 335a).
Polemarco se convence que sua ideia de justiça também é falha e aceita que entre Trasímaco na discussão para formular uma ideia de justiça perfeita, que seja útil para o homem e para o estado. Com isso, este apresenta uma nova ideia.  Trasímaco, afirma que: “a justiça não é outra coisa senão a conveniência do mais forte” (PLATÃO, República, I, 338c).
Outra tese não aceita, segundo Sócrates pelo motivo de que se agente refletir sobre a história da governabilidade que tivemos todos esses anos, notamos que nem sempre o mais forte é conveniente e justo. Platão, no livro I, refuta o terceiro oponente dizendo: “o mais forte às vezes cai quando acontece uma tirania e, assim, não podemos compor essa tese como absoluta e perfeita” (PLATÃO, República, I, 340e-352b).
Após a saída de Trasimaco, entra um batedouro com a quarta ideia de justiça, e, esta por sua vez, quase incontestável. Gláucon diz antes de citar o mito do anel que:
Uma injustiça é, por natureza um bem, e sofre-la, um mal, mas que ser vítima de injustiça é um mal maior do que o bem que há em cometê-la. De forma que quando as pessoas praticam ou sofrem injustiça umas das outras, e provam de ambas, lhes parece vantajoso, quando não podem evitar uma coisa ou alcançar outra, chegar a um acordo mútuo, para não cometerem injustiça nem serem vítimas dela. Assim, se originou o estabelecimento de leis e convenções e a designação legal e justa para as prescrições da lei. Logo, a justiça é uma convenção entre as partes, um acordo justo (PLATÃO, República, I, 359a).
No entanto, Gláucon conta o mito de um anel para reforçar sua ideia de justiça. Segundo ele, havia um homem de nome Giges, um pastor que servia o Rei Lídia. Certo dia, um terremoto abre uma fenda no chão onde apascentava o seu rebanho de ovelhas, e por incrível que pareça, havia um cavalo de bronze, oco, com aberturas, e no interior um homem muito alto que estava morto. O homem estava despido e tinha apenas um anel de ouro no dedo. O pastor (Giges) o pegou o anel e foi embora. Pela tarde, ele foi a uma convenção e lá sentado, resolve mexer no anel e ele ficou invisível. Admirado, o feito para certificar-se de que o anel tinha esse poder e concluiu que ao virar para dentro tornava-se invisível e ao girá-la para fora voltava a ser visto. Quando teve certeza disso, juntou-se aos pastores que iriam até o rei como representantes do grupo. Chegando ao palácio, seduziu a Rainha e com o apoio direto dela, atacou e matou o Rei, apoderando-se do trono (PLATÃO, República, I, 360b).
E disto se poderá afirmar que é uma grande prova, que quem é justo por sua vontade, mas constrangido, por entender que a justiça não é bem para sí, individualmente que quando cada um julga que lhe é possível cometer injustiças, comete-as. Evidentemente a maioria dos homens acreditam que é mais vantajoso praticar uma injustiça do que cometer uma justiça. Na visão de Gláucon, “a justiça é uma convenção entre as partes”(PLATÃO, República, I, 360d).
Sócrates faz uma reflexão mais detalhada e de forma convincente sobre a tese da justiça construida por Gláucon:
Havíamos, contudo de escolher a justiça, de preferência a uma injustiça de maior amplitude, uma vez que, se assegurarmos os resultados desta com uma falsa respeitabilidade, procederemos a nosso bel-prazer junto dos deuses e dos homens, quer em vida, quer depois de mortos, tal como diz a afirmação feita pelo povo em geral e pelas pessoas de categoria mais elevada. Logo, a justiça que está em jogo é perfeita e incorruptível” (PLATÃO, República, I, 366c).
Como podemos compreender a justiça para uma pessoa pode ser diferente para outra, mas o que está em discussão é uma ideia justa e perfeita de tal conceito. Sócrates refuta a tese do ultimo sofista, construindo várias comparações e no contexto delas, convence todos os presentes na casa de Céfalo.
Pelo que pudemos observar no contexto acima, foram produzidas muitas teses a respeito da ideia de justiça, mas nenhuma foi considerada absoluta, pelo motivo de haver exceções. A ideia de justiça que estava em jogo, beneficiaria a cidade ideal que para ser justa e feliz, Platão, fez uma comparação do corpo humano (dualismo: corpo e alma), ou seja, nossa alma possui três divisões, partes. No entanto, isso pode nos parecer estranho uma vez que em nossa cultura consideramos a alma humana como algo único, como aquilo que nos dá uma identidade. Mas no contexto da antiguidade ele (Platão) afirmava que nossa alma possui três partes distintas; uma “alma inferior” que se subdivide em duas, e está intimamente ligada ao corpo humano, sendo tão mortal quanto ele; e uma “alma superior”, essa sim, eterna e imutável.
A alma inferior é constituída de uma alma localizada no ventre, responsável por nossos desejos e nossas paixões, Platão a denominava concupiscível, relativa à cobiça, ao desejo (PLATÃO, República, IV, 442b), e de outra, localizada no peito, responsável por nossas emoções, denominada irascível, ligada a ira, a irritação (PLATÃO, República, IV, 442c). Observamos que cada uma dessas almas está relacionada com coisas que sentimos (desejos, paixões e emoções), uma vez que o corpo é a sede dos sentidos. A alma superior, segundo Platão, é a alma racional, que se localiza na cabeça e é responsável pelo pensamento (PLATÃO, República, IV, 442c). Essas três partes da alma possuem relação direta com o nosso pensamento, com nossa forma de agir. Nesse sentido, todos nós pensamos e temos desejos, paixões e emoções. O que ocorre é que em cada pessoa uma dessas situações prevalece sobre as outras. Por isso, Platão, afirmou que cada um de nós tem um temperamento, que é a forma como as três almas se temperam, se misturam com uma delas predominando. De forma simplista, são três os temperamentos ou caracteres básicos da alma:
No Caráter Concupiscível: Predomina os nossos desejos, nossas paixões. A pessoa com esse caráter, pensa, se emociona, mas sua vida é controlada pelos desejos. Quando precisa decidir alguma coisa, é a impulsividade do desejo que prevalece.Nesse sentido, podemos afirmar com propriedade que a maioria das pessoas possui esse temperamento e de uma maneira simplista, podemos concluir que estão associados aos artesãos, agricultores, etc.
No Caráter Irascível: predomina as emoções. Uma pessoa com caráter irascível também deseja, pensa, mas suas decisões são tomadas com base na emoção. Frisamos que esse temperamento está associado às pessoas que possuem coragem para guerrear. Estas devem participar da segurança da cidade.
Ja, no Caráter Racional: predomina a razão. O caráter racional não torna a pessoa fria e insensível; ela deseja, ela se emociona, mas suas decisões são sempre tomadas de forma racional, de maneira muito bem pensada e avaliada. Faz-se necessário dar ciência que, as pessoas que possuem esse temperamento de racionalidade, devem administrar, e aqueles que não possuem, devem ser administrados.
Para o filósofo Platão, a condição ideal para o ser humano é o predomínio de um caráter racional, a situação em que a alma racional controla nosso corpo, não negando os desejos e as emoções, mas dosando-os, organizando-os de acordo com o pensamento e o planejamento. Ele reconhece, no entanto, que nem todos os seres humanos são assim. Tendo em vista os três caracteres básicos, Platão acredita que habitam na cidade justa três classes sociais. As pessoas de caráter concupicível, seriam responsáveis pela produção, os artesãos e profissionais em geral. Estes viveriam absolutamente livres como pede o seu caráter. Aqueles que vivem de acordo com as emoções (Irascível), seriam os guerreiros, os guardiões da cidade, pois viveriam de acordo com sua coragem. Por fim, as pessoas de caráter racional, seriam os administradores responsáveis pelas atividades de gestão, pois seriam capazes de governar com justiça. Dessa forma, cada classe contribuiria com as necessidades da cidade e teriam condições de viver de acordo com sua natureza. Logo, uma cidade governada com justiça, que possibilita cada cidadão viver segundo suas aptidões específicas e alcançar a felicidade, essa seria a cidade justa para Platão. Nesta, a parte que age mais de acordo com sua própria natureza é qualificado virtuoso, uma característica que cada indivíduo possui e faz com que seja capaz de fazer o bem para si mesmo e para os outros (PLATÃO, República, IV, 444d).
A virtude na visão de Platão é o principal valor compartilhado pelos cidadãos da cidade justa porque é aquilo que move suas ações. O político, por exemplo, que age de forma racional legislando em observância as leis e gerindo os bens públicos, de acordo com as necessidades da cidade, é um virtuoso. Sendo assim, é possível que se entenda a virtude como um valor individual, o que, entretanto é um equivoco. Todavia, para Platão, valores como, felicidade, justiça, e virtude são universais, isto é, valem para todos e em qualquer época e lugar.  Sobre a virtude, o filósofo afirma já está ela presente em nós desde o nascimento. Porém, precisamos alcançá-la pelo autoconhecimento. Só assim, por exemplo, o cidadão, saberá se orientar racionalmente na hora de refletir e escolher as melhores ações que estejam de acordo com sua natureza, com a justiça e o bem comum da cidade e consequentemente com a felicidade.
Nota-se então, que Platão faz uma analogia entre as partes de uma cidade ideal, onde cada uma das partes da alma possui suas funções específicas que não podem ser exercidas por nenhuma das outras partes. Então, cada uma das partes da alma, tem uma função própria a qual pode ser executada com excelência ou não, e, ao executá-la com excelência, sua virtude própria é exercida. Não obstante, a virtude é definida, como a capacidade de realizar a tarefa que lhe é inerente.     
Comparando a um governante de uma cidade e da alma racional, a virtude inerente aos mesmos é a sabedoria; Já comparando ao guerreiro e da parte irascível da alma, a virtude que lhes é própria é a coragem; logo, no caso da parte concupiscente da alma e dos produtores de bens da cidade, a virtude própria é temperança. Fazendo a distinção de cada classe, pode-se definir a justiça semelhante cada parte fazendo o que lhe compete, conforme suas aptidões. Então, ao estabelecer uma relação de analogia entre a sociedade e indivíduo, Platão, define o nome de “justiça”, todavia seria também concebido como princípio de equilíbrio do indivíduo e da sociedade e a harmoniosa ao conceito de virtude (PLATÃO, República, IX, 585a-592a).

1.2 Tentativas de educar Dionísio II para formar o governo justo em Siracusa

Os livros VIII e IX da República apresentam teorias sobre a decadência do regime perfeito (o governo do rei filósofo), é a tirania que aparece como o último estágio dessa degeneração. Na Carta VII que Platão levanta a possibilidade de os reis ou seus filhos serem transformados em filósofos (Rep. 499b). Nas Leis, o jovem tirano bem dotado é visto pelo Legislador como um instrumento privilegiado de reforma política (Leis 709e-710a). Nesta última obra, Platão considera até a possibilidade de recorrer ao legislador tirano para executar a purificação radical na cidade (735ce).
Contudo, a oportunidade de conviver com o tirano e de conhecer suas paixões, Platão a teve quando, por três vezes, tentou converter os Dionísios de Siracusa à filosofia. Foi vítima do arbítrio de ambos. Essa experiência, que pode ser conhecida pela leitura da Carta VII, compreendeu um período significativo de sua vida, dos quarenta aos sessenta e oito anos, quando construiu as grandes linhas de sua filosofia e foi consolidando suas ideias acerca do poder, da justiça e da felicidade. Todas às vezes, em que Platão foi à Sicília seu objetivo era converter o tirano à filosofia e dar apoio a seu discípulo e amigo Díon, que pretendia transmudar a tirania siracusana em realeza constitucional, misturando autoridade com liberdade, e promovendo uma reforma dos costumes. Díon, siracusano e parente dos tiranos, empenharia sua vida, seus bens e sua honra nesse projeto, que, apesar disso, não vingaria.
Ao tempo da Carta VII, de que ora tratamos, Díon já está morto (353 a.C.), por traição do ateniense Calipo, companheiro e aliado no golpe que em 357a.C. destronara Dionísio II em Siracusa.  Platão, sob o impacto dessa perda, dirige o texto aos amigos e parentes de Díon. Apesar de a missiva ter destinatários certos, trata-se de uma carta aberta, que, em última análise, representa um depoimento de Platão acerca de sua experiência na Sicília, mais precisamente, em Siracusa, que visitara três vezes, em momentos diferentes de sua vida.
Por volta de 388 a.C. teve início da ação política de Platão na Sicília. Ele tinha quarenta anos e Siracusa era governada por Dionísio I, que se designa também por Dionísio, o velho (430-367 a.C) Dionísio, eleito aos 25 anos, com plenos poderes, governaria Siracusa como tirano por vários anos, como libertador dos gregos sicilianos da pressão cartaginesa.
Na segunda viagem Platão tem 60 anos (366 a.C) e, estimulado pela força viril e idealismo de Díon, apresenta-se diante de um jovem tirano de 25 anos (Dionísio II), mais uma vez esperançoso, na fé de realizar seu projeto político educativo. Mas o tirano, sensível por  intrigas de amigos da tirania do que aos encantos da filosofia, acabará por desterrar Díon e lhe reter os bens.
No entanto, na terceira viagem (361 a.C) vem a cair a máscara do tirano. Platão, agora com sessenta e oito anos, percebe que Dionísio II brinca com a filosofia e articula um perfil do jogo com ele e com seu amigo Díon, pois não apenas proibiu-lhe a saída de Siracusa como se negou a revogar quaisquer medidas que tomara contra Díon. Novamente enclausurado e correndo riscos, Platão sente ameaçado o dia de seu regresso à Grécia. Após relatar o estado em que encontrou a corte de Siracusa, o grau de decadência dos costumes e reconhecer o mau caráter de Dionísio, informa: “Foi assim que até aquela data eu trabalhei em prol da filosofia e dos meus amigos. A partir de então, vivemos, eu e Dionísio, da seguinte maneira: eu, olhando para fora, como passarinho impaciente de escapar da prisão; Dionísio, excogitando algum meio de acalmar-me, porém sem me entregar a menor parcela dos bens de Díon. E contudo, a Sicília inteirinha nos tinha na conta de grandes amigos.” (Carta, VII, 347e- 348a).
Por conseguinte, 360 a.C., para finalmente deixar Siracusa, Platão vai recorrer aos bons ofícios de seu amigo Arquitas, tirano de Tarento, filósofo e matemático de renome, que, diplomaticamente, obtém a sua libertação. Quanto a Díon, acusado de conspirar com os cartagineses, por obra e graça da vontade do tirano, estava fadado a não mais ver a luz do dia em Siracusa; Dionísio II prejudicava-os em escrúpulos, moral e materialmente.
O destino de Díon é conhecido: permanecerá na Grécia como exilado político até retornar à Sicília, por iniciativa própria, em ação revolucionária. O epílogo do projeto de Platão e Díon, para recuperação do regime, foi violento: ocupação de Siracusa por Díon, em golpe contra Dionísio II (357 a.C.), que fugiu; curto governo de Díon (4 anos), assassinado 353 a.C., em cilada do ateniense Calipo. Estes, os fatos. Vejamos agora como Platão apresenta e relata estes acontecimentos. O contexto em que devemos compreender a ação política de Platão em Siracusa é explicado pelo próprio Platão. Diz ele, na Carta VII: “Quando moço, aconteceu comigo o que se dá com todos: firmei o propósito, tão logo me torna-se independente, de ingressar na política” (324 bc). Pertencendo a uma família aristocrática, Platão integrava a elite e, nessa condição, naturalmente seu destino seria a política. Todavia, os acontecimentos que se seguiram à derrubada da democracia pelos oligarcas (411 a.C), à derrota de Atenas na Guerra do Peloponeso e à violenta tirania dos Trinta (404 a.C.), levaram-no a rever suas pretensões (PLATÃO, Carta VII 324c-325a).
No caso, esperava-se que a conversão do tirano resultasse numa reforma do regime e, claro, do próprio estilo de vida do governante. Como Platão justifica a experiência de Siracusa? Pela necessidade de unir o discurso à ação: não quer ser acusado de ser homem de palavras, apenas (VII 328c). A oportunidade lhe parecia perfeita. Dionísio I tinha poder, riqueza e um reino; gosto para a filosofia e educação do espírito; talvez conseguisse influenciá-lo e promover uma vida feliz e verdadeira em todo o país: “Nunca houvera uma ocasião como aquela, de vir a concretizar se nos mesmos homens à união da filosofia e do governo das cidades....também confiava no caráter de Díon, naturalmente firme, por ele já ser de idade madura.... acabou de decidir-me a consideração de que era chegado o momento de tentar por em prática meus projetos de legislação e de governo.
Para tanto, este, o contexto em que se desenvolve a ação política de Platão na Sicília. Vejamos, agora, suas implicações. Na Carta VII confirmam-se certas ideias que reencontramos nos diálogos. Como na República, Platão estabelece a justiça como a viga mestra da alma e da cidade, afirma, como no Fédon e outras obras, a crença na imortalidade da alma e no julgamento que, após a morte, castiga o homem mau. Além disso, como o Sócrates do Górgias, as bases da moral grega, de feição particularista, ele as amplia, preferindo ser vítima de uma injustiça a praticar o mal.
Existem também, na Carta VII, elementos para avaliação da figura do governante ideal o filósofo. Dionísio II julgando-se com vocação para a filosofia, posava de filósofo, razão pela qual Platão é motivado pelos amigos a voltar pela terceira vez a Siracusa, para conferir in loco e pessoalmente os avanços filosóficos que o tirano proclamava as quatro ventos (PLATÃO, Carta, VII, 545c-550a).

2. As ideias sobre a Justiça e do Bem em Platão. 

Podemos afirmar que o sentimento de justiça é, pois, a virtude maior cujo valor ético guia as condutas dos homens. Para que esta virtude seja alcançada, o homem deve buscar o bem em si mesmo, porque ele realiza o ideal de justiça, tanto com relação ao bem individual quanto social. Frisamos que ética platônica ocupa-se com o correto modo de agir e sua relação com o alcance da felicidade. Não obstante, o discurso ético apresentado na República acerca da felicidade relaciona esta com o conceito de justiça.
Não podemos deixar de ressaltar que o problema da justiça enquadra-se no âmbito político, no qual tem estreita relação com o campo da ética: é deste modo que surge a tese central de que só o justo é feliz. No diálogo República, nós procuramos construir o tema “A cidade justa na República de Platão”, surgiu o problema cerne acerca da definição da justiça para que pudéssemos posteriormente, definir o que é a justiça tanto no indivíduo quanto no Estado. Existe, pois, um paralelo entre estado e indivíduo a fim de que encontrássemos a definição de justiça.
Segundo o filósofo ateniense, Platão, a sociedade seria semelhante a algo orgânico e bem integrado, como uma unidade construída por vários elementos independentes, embora integrados. Afirma que a cidade forma-se por três classes, como já apontamos, e cada classe possui sua função específica. No entanto, é necessário notar que tais funções são determinadas conforme as aptidões naturais de cada membro da cidade. Neste sentido, o objetivo desta divisão é mostrar com mais clareza como ocorre o mesmo na alma humana. A finalidade da cidade justa na República é, então, propiciar a felicidade do indivíduo ao viabilizar a prática de suas virtudes, de suas aptidões específicas. Temos que ter ciência de que a virtude correspondente a cada classe da cidade e a cada parte da alma humana deve ser ensinada visando à realização do ideal da pólis.
A educação proferida por esta embasa-se no método dialético ascendente, o qual liberta o homem dos sentidos e o eleva até o mundo inteligível, até o ponto mais claro do Ser, a ideia do Bem. Após contemplar o Bem diretamente, o filósofo deve retornar à cidade que lhe propiciou educação de modo a guiar os outros cidadãos da ignorância ao conhecimento racional. Fica claro que a proposta do filósofo Platão, conecta-se, principalmente, às ideias de Justiça e do Bem. Este último é o supremo valor que sustenta a justiça com relação à organização política e à conduta individual. Cujo equilíbrio entre as três partes componentes da alma e da cidade gera equilíbrio, harmonia e leva à felicidade. Assim, Platão busca por definições gerais, universais, imutáveis, eternas, existentes por si mesmas: Ideias, enfim.
Por conseguinte, agora, estamos em busca de saber em sua essência, “o que é teoria política, já que tratamos de justiça na cidade ideal?” Esse questionamento é muito importante, já que tem sido o pilar dos novos campos de investigação. Iremos tomar como consideração que esse questionamento não foi respondido de forma convincente, então, faz-se necessário conferir uma nova maneira de obtenção teórica da política.  No mais, existem razões para que isso tenha ocorrido na Idade Média, e, pretendemos explorar como tal verdade modificou de forma completa sua maneira de proceder, dando condição em grande parte (ainda que não determinado) a estrutura dos textos próprios.
Não podemos esquecer que o conceito “política” nasce do grego, dai, poderíamos começar uma investigação acerca da probabilidade de junção do conhecimento sobre tal tema.  Evidentemente que o conceito não diz respeito a algum saber teórico. De forma mais simplista, a política era o agir na cidade (pólis), e mesmo enquanto atividade prática tinha diferenças de significados em relação ao termo igualitário do modo como é usado na atualidade. O filósofo ateniense, Platão, porém, pretendia que a política deveria ir além das simples relações sociais efetivas de atritos e colaboração, que elas fossem naturalmente ou escolhidas pelos governantes. No mais, ele, busca a possibilidade de construir, por meio da razão, uma ordem para as relações existentes, com intuito de aproximar de um ponto específico que esta determinaria.  Neste sentido, a política já não seria alvo de modificação, sendo um modelo pensado, sem ter direção para onde seguir; surge a ideia. As modificações desta, “política” jamais seriam feitas pela vontade do povo ou governo. Platão, constrói um fim; ele resolve então, tratar dos meios.
Ressalta-se ainda, que o livro “A República” tem por objetivo apresentar o governo ideal. Para o filósofo escritor, o governo ideal é aquele que haja com justiça, ou seja, é justo, se devemos buscar alguma teoria política neste pensador então, esta se relaciona a justiça e a maneira pela qual é possível alcança-la. Sabe-se que a justiça platônica, não se refere somente no que se refere às relações dentro da organização política dada ou aquelas entre os indivíduos no seu particular.  Noutras palavras, a justiça refere-se também a natureza do indivíduo (alma, sabedoria e virtude) e, em última instância, à organização do universo em cosmos.
Devemos salientar que o texto de Platão, muitas vezes é mal interpretado, pois nota-se em alguns escritos pesquisados possui conclusão prematura; será que os filósofos devem ser Reis, ou os Reis devem ser filósofos? Percebe-se que esse não é o caso: Ter um governante é uma necessidade para evitar uma catástrofe, ou melhor, “ser governado por alguém é bem pior do que a gente quando a gente mesmo não quer governar. Não obstante, na hipótese de uma cidade homens de bem viesse à existência, lutar-se-ia nela, parece-me, para escapar ao poder”
Contudo, só existe governo então, porque nem todos os homens são “homens de bem”. Mas, sabe-se que a justiça que deve aparecer na cidade ideal não é apenas aquela que o governo impõe pela lei ou pela força (tirania), é também aquela do indivíduo que sai da caverna (zona de conforto) e busca olhar o sol; ainda que a maioria jamais possa fazê-lo. Sendo assim, a República não é um simples modelo para se fazer leis, ela é a tentativa do futuro filósofo de criar uma nova ética para o ser humano, aquela do agir racionalmente. Se não há a crença de que todos possam alcançar o conhecimento, privilégio dos filósofos, concebe-se que todos possam compreender que quem deve governar são esses capazes de atingir as essências, enfim (PLATÃO, República, II, 347d).
Nota-se, no livro “A República”, assim como em quase todos os seus escritos, o filósofo Platão, usa o diálogo citando outros personagens para tratar sobre questões filosóficas que foram propostas, visando alcançar as ideias do filósofo, com isso, mesmo se a semelhando apenas uma discussão entre personagens sobre o posicionamento de um e de outro no que diz respeito aos temas tratados é, possivelmente, uma sucessão de assuntos propostos em busca de atingir uma sentença final, uma máxima sobre o assunto, que não é necessariamente atingida.

2.1 Educação e Valores da Cidadania

Entre os primeiros diálogos de Platão, os mais conhecidos são a Apologia de Sócrates, o Gógias, e o primeiro livro de A República. Certamente, Platão tinha 32 anos quando começou escrever. Nessa fase, a figura de seu mestre (Sócrates) se faz presente e Platão faz muitos questionamentos, tais como: como formar um bom cidadão? Como reparar a ausência de verdadeiros mestres desde a guerra do Peloponeso? Será que a virtude que constitui o valor do homem e do cidadão, pode ser ensinada? Assim, Platão inicia suas pesquisas filosóficas: Perguntas sinceras que demandam a busca de uma resposta verdadeira.
Nesta época não faltavam em Atenas “mestres” da virtude e “profissionais” da educação, os sofistas, permanecentes adversários de Sócrates, Platão e Aristóteles. São mestres duvidosos que não se preocupavam com as verdadeiras respostas aos problemas, no máximo adaptam regras antigas aos costumes atuais, no dia a dia da pólis.  São “mercadores de opiniões”.
Para Sócrates e Platão, a virtude não se aprende como a matemática; não é assunto de instrução. Mas a virtude se transmite pela influencia das pessoas de bem que sabem o que é o bem que dá fundamentação as nossas condutas. Numa palavra, para Sócrates e Platão, é preciso buscar um fundamento inabalável e objetivo da virtude. “Não peço que me mostres o exemplo de um ato justo, mas peço que me faças ver a essência por força da qual todas as condutas justas são justas” (Rep., 230c). Portanto, há que descobrir um princípio que regule nossos julgamentos de valor moral.
Mas tarde Platão dirá que o princípio regular dos comportamentos é a Ideia, sobretudo a Ideia do Bem. Afirmar as ideias será afirmar que há valores independentes das opiniões dos homens, especialmente dos sofistas. Valores que se impõem a todos os homens razoáveis e que são objetos da investigação do filósofo sincero que procura a verdade, a justiça e o bem.
A ciência dos valores é necessária para a educação moral do cidadão que deseja viver na justiça. Como dissemos, Platão construirá esta ciência a partir da ideia, tomada primeiro em sua função gnosiológica e, depois, em sua função axiológica. Explicitando: em a República, Platão adotou o caminho do conhecimento da justiça e, por ela, chega a ciência do bem supremo valor objetivo.
Segundo Platão, para saber o que é justiça é melhor começar pela sociedade do que pelo indivíduo. Na sociedade, que reúne todos os cidadãos e todas as funções, aparece mais facilmente o que é justo ou injusto. Ora, na cidade, a origem da justiça é a divisão do trabalho.  A justiça está em que cada um cumpra sua função, seu dever na pólis; injustiça é o contrário.  Então, a justiça harmoniza as ações dos membros da comunidade: os trabalhadores, os guerreiros e os magistrados; a justiça é harmonia das muitas funções que gerenciam a pólis.
Por analogia, descobre-se também o que seja justiça na pessoa. As três partes da alma são justas quando cumprem sua função: o apetite que nos leva aos objetos necessários a conservação do corpo e da vida; a paixão pela defesa que se manifesta nas reações de cólera e nos sentimentos de indignação face às injustiças e que leva o guerreiro a defender contra os inimigos, o que é justo, o valor das pessoas e da polis; a razão que subordina a seu comando os dois outros sentimentos que são auxiliares da razão.  Esta é a ordem justa e a harmonia nas funções variadas da alma.
Então, por esta via, chega-se a definir objetivamente a justiça da cidade e da alma. Reina a justiça quando as três classes sociais e os elementos constitutivos do homem, razão, paixão e apetite – são hierarquicamente ordenados e subordinados. Então a justiça gera a harmonia na sociedade e na alma, elevando-a ao seu fim que é a contemplação do supremo bem. Para chegar a isto é preciso elevar-se acima da análise-psicológica e sociológica e mergulhar na contemplação filosófica do mundo superior.
Este é o sentido dos livros V e VII de a República e dos diálogos sobre a teoria das Ideias, fundamentos do conhecimento dos valores permanecentes e divinos sobre os quais os sofistas não poderão sofismar.
Agora sim há certeza: a moral, para ser ciência do bem, deve se fundar sobre conceitos puros, existentes apriore: as ideias especialmente a ideia da Justiça e do Bem. É preciso que a moral seja definida em termos formais para que possamos verificar se ela é expressão exata do Bem Supremo; Se corresponde às condições de harmonia interior da alma e da perfeita unificação das condutas dos cidadãos e se mantém firme a hierarquia das classes sociais. Este é o objeto do conhecimento filosófico: o conhecimento objetivo da justiça.
O passo seguinte, na exata sequencia do anterior será cedente, será axiológico, isto é, a afirmação do supremo valor, o Bem transcendente, fundamento da justiça na sociedade e no homem. Este élen espiritual é célebre no Fédon: quando a alma se entrega as impressões sensíveis e por elas julga a realidade dos objetos e dos valores é arrastada ao erro e ao delírio; Cai na embriaguez e na vertigem. Ao contrário, quando ela se recolhe, quando entra em si mesma toma impulso em direção do que é puro, eterno, incorruptível e imutável. Na interioridade, ele toma consciência de sua aspiração a transcendência e de sua conaturalidade com o divino; mais ela entra em si mesma, mais ela é transformada para o absoluto.
Esta belíssima passagem se encontra resumida também no livro X de A República.  É neste parentesco divino que Platão funda a imortalidade da alma. Ela é o princípio de organização que mantém no corpo humano o equilíbrio dos elementos contrários e que é análoga ao princípio supremo, o Bem e a Justiça, donde resulta a harmonia do universo (PLATÃO, Fedro, 427a-347c).

2.2 A justiça na República de Platão

Toda a filosofia de Platão é um processo de educação para a justiça e para o estado bem ordenado, teses de sua obra central, a República. Preparou-a com várias viagens que o levaram provavelmente ao Egito e, certamente, a magna Grécia, onde voltou três vezes discutindo com os círculos pitagóricos, estrategistas de governo, matemáticos e foi neste contexto que criou a figura do “rei-filósofo”. Portanto, este é o cenário no qual foram gestadas a ética e a política do Ocidente. Platão trata da justiça como fundamento do universo, apoiando-se na tradição dos poetas Homero e Hesíodo. A justiça é uma deus que dita as leis do cosmos, da sociedade e do homem, tema retomado em que em quase todos os diálogos.
Segundo o filósofo ateniense (Platão), o nous é a fronesis (prudencia ou sabedoria). Pelo intelecto assim definido, o filósofo dialoga com o mundo divino das Ideias, da Verdade e do Bem Supremo e ao mesmo tempo dirige sua vida quotidiana.  Em síntese, em Platão, a fronesis é a luz que comanda toda a existencia humana erguendo-a até a divindade.
O livro I, da República de Platão, tem início com filósofo, Sócrates narrando para um grupo anônimo, onde sua descida ao Pireu no dia anterior para a festa da deusa de nome Bêndis. Ali permaneceu por pedido de Polemarco que o hospedou em sua casa e lá se desenvolveu o famoso diálogo. As primeiras pessoas que falaram com Sócrates foram: Céfalo, pai de Polemarco, Lísias e Eutidemo. A vida de Céfalo foi pouco relatada, proveniente de Siracusa, chamando a Atenas de Péricles, tinha uma fábrica de escudos, na qual trabalhavam muitos escravos. Para tanto, os diálogos foram apresentados já em idade avançada. Interrogado por Sócrates sobre a velhice, Céfalo se apresenta feliz por ter vivido de modo "justo", restituindo aos deuses e aos homens o que lhes era devido. Sócrates então percebeu na resposta de Céfalo, uma concepção de justiça que é, senão inadequada, ao menos insuficiente, momento em que Polemarco entra no diálogo e Céfalo o abandona, retirando-se (PLATÃO, República, I, 329a).
Após a saída de Céfalo, entra Polemarco, o fiel herdeiro da discussão em favor do pai. Ao argumentar que Céfalo aludiu como justiça, pertencente ao senso comum, Polemarco chama em defesa Simônides que, apesar de todas as reservas platônicas contra os poetas, é tido em boa conta. Sócrates o chama de "homem divino e sapiente". A famosa máxima sobre a justiça a ele atribuída por Polemarco: "dar ajuda aos amigos e prejuízos aos inimigos" (PLATÃO, República, I, 332d). Entra assim em cena o filósofo, Polemarco, com quem Sócrates poderá discutir.
Ressaltamos que Sócrates, diz não ter entendido bem o que queria dizer Simônides com esta máxima, e assim, começou interrogar Polemarco, pois o poeta certamente não a teria formulado sem nenhuma restrição, como no caso da objeção já apresentada a Céfalo. Polemarco disse que Simônides é convicto de que se deve fazer o bem aos amigos e não o mal. Assim se chega à primeira definição de justiça: restituir ao amigo o que lhe é devido quando isto não lhe seja um mal. Logo se tirarão as consequências passando a soar assim: "a justiça consiste no beneficiar os amigos e no fazer mal aos inimigos". Como Polemarco insiste nesta definição, Sócrates a reexamina perguntando-lhe o que entende por amigo. A conclusão é que amigo é aquele que aparenta e de fato nos faz o bem. Com isto se precisa ainda mais a definição de Polemarco: "o justo consiste em fazer o bem ao amigo que é bom e o mal ao inimigo que é mal"(PLATAO, República, I,332d ), mas que Sócrates refuta (através de um sofisma) mostrando o quanto é errônea.
Assim, Sócrates apresenta uma conclusão de seu diálogo com Polemarco, sobre a justiça:  “Não é então sábio quem sustenta que a justiça consiste no restituir a cada um o que lhe pertence, e com isto entenda que o homem justo deve restituir mal por mal aos inimigos e bem por bem aos amigos”(PLATÃO, República, I, 335e). A conclusão de Sócrates se apresenta o que já é notório sobre sua concepção de virtude: quem conhece o bem não pode fazer o mal, por isso "não é sábio" quem pratica a injustiça. Ninguém pode ter prazer em fazer o mal pelo mal e, sobretudo, em fazer o mal a si mesmo, ora, como Sócrates afirmou, a injustiça não é tanto um mal para quem a sofre quanto para quem a comete, portanto o injusto é o ignorante que comete o maior mal a si mesmo.(PLATÃO, República, I, 335a).
No entanto, Sócrates e Polemarco interromperam no diálogo, e Trasímaco, que já havia tentado intervir, mas foi interrompido pelos outros que queriam ouvir a argumentação até o fim, levantou-se furiosamente contra Sócrates. Não lhe agrada o seu método que consiste, segundo ele, em fazer perguntas para posteriormente confutar seu interlocutor, sem dar uma resposta, "já que é mais fácil perguntar que responder". E pede a Sócrates que dê a sua definição de justiça, em um modo claro e conciso, sem se exprimir por meio de frivolidades como ser a justiça "o dever, ou a utilidade, ou a vantagem, o proveito ou a conveniência".
Então, Sócrates defende seu método reiterando sua ignorância no que concerne ao assunto em questão e sua sincera disponibilidade em aprender, provocando Trasímaco a que o ensine e aos presentes. Claro que Trasímaco queria falar, embora para isto tenha pedido um pagamento. Como mestre de eloquência tinha ali uma boa oportunidade, diante de um público qualificado, de demonstrar seus dotes, dominar a conversa e arrancar elogios. Trasímaco demora em atender ao pedido também dos outros, mas é só para valorizar-se. É certo que o próprio Sócrates havia notado que "Trasímaco, desejava falar para se cobrir de glória, pois supunha que daria uma resposta admirável". Porém, assegurado o pagamento Trasímaco apresenta sua definição de justiça: "afirmo que a justiça não é outra coisa senão a conveniência do mais forte", ao que Sócrates dá um sentido restritivo, interpretando como conveniência do que é superior em força física: “se para Polidamas, o lutador de Pancrácio, que é o mais forte de todos, lhe convém, para o seu físico, comer carne bovina, tal alimento será justo e conveniente também para os outros, ainda que a ele inferiores”.
Trasímaco não concorda e protesta contra a má interpretação de Sócrates e precisa sua definição: o mais forte é quem governa e faz leis úteis a si próprios. "Certamente que cada governo estabelece as leis de acordo com a sua conveniência, uma vez promulgadas essas leis, fazem saber que é justo para os governos aquilo que lhes convém, e castigam os transgressores, a título de que violaram a lei e cometeram uma injustiça", portanto se pode "afirmar que há um só modelo de justiça em todos os Estados - o que convém aos poderes constituídos. Ora estes é que detêm a força" (PLATÃO, República, I, 339a).
Portanto, a definição de justiça dada por Trasímaco é eivada de pessimismo, aplicando como princípio geral que ninguém procura o útil para os outros, mas sim a si próprio. Por isso, os governantes que têm o poder maior, de fazer a lei e punir quem não as cumpra, submetem os súditos à sua vontade e utilidade. Trasímaco então, afirma o direito de natureza, "do mais forte", sobre as convenções sociais, ou seja, a diferença entre os fracos e subjugados e os fortes e dominadores não é positiva, mas natural. O seu princípio sobre a justiça como conveniência do mais forte, tem, portanto, uma fundamentação natural: é justo que o mais forte governe em benefício próprio e é justo que o mais fraco se deixe governar em sem prejuízo. Rebelar-se contra esta lei que tem fundamento natural é injustiça, e consequentemente, merece punição (PLATÃO, República, I, 339b).
Noutras palavras, a justiça para Trasímaco é egocêntrica, é a satisfação dos próprios desejos, e aquele que consegue satisfazer seus desejos é por definição o mais forte. E, Sócrates faz um balanço das afirmações de Trasímaco, lembra que o termo "conveniência" era um dos quais Trasímaco havia feito restrições. Sua definição tem, portanto, de inovador somente a especificação: "do mais forte". Concordes em que a justiça é uma conveniência, alguma coisa de útil, deve-se analisar o "mais forte". Sócrates o faz perguntando se os governantes são falíveis, ao que Trasímaco consente. “Ora, se eles também erram, alguma vez formularão leis que não os beneficie, mas que lhes cause prejuízos. A conclusão é evidente, como os mais fracos deverão obedecer sempre, alguma vez será justo fazer o que não convêm ao mais” (PLATÃO, República, I, 339d).
E assim Sócrates coloca-o em xeque: "ora, pois, ó Trasímaco, não será forçoso que resulte daí a seguinte situação: que é justo fazer o contrário do que você diz? Pois não há dúvida que se prescreve aos mais fracos que façam o que é prejudicial aos mais fortes". Conclusão que tem o assentimento da plateia. Mas Trasímaco discordando da conclusão de Sócrates precisa ainda mais sua definição: quem erra não é forte quando erra, como o médico não é médico quando se engana relativamente ao paciente, precisamente pelo fato de se enganar; ou hábil calculador aquele que erra os seus cálculos, precisamente pelo fato de errar. Consequentemente, artífice, sábio ou governante algum se engana enquanto estiver nesta condição. Assim, "o governante, na medida em que está no governo, não se engana; se não se engana, promulga a lei que é melhor para ele e é essa que deve ser cumprida pelos súditos" (PLATÃO, República, I, 340a).
Por conseguinte, partindo do próprio argumento de Trasímaco, Sócrates demonstra que toda arte procura o bem de outrem, não o próprio, exemplo paradigmático é a medicina: o médico possui a ciência médica para curar os enfermos, ou seja, "a medicina não procura a conveniência da medicina, mas do corpo". A esse ponto Sócrates pode concluir:
Nenhuma ciência procura ou prescreve o que é vantajoso ao mais forte, mas sim ao mais fraco e ao que é por ela governado. Portanto, nenhum chefe, em qualquer lugar de comando, na medida em que é chefe, examina ou prescreve o que é vantajoso a ele mesmo, mas o que o é para seu subordinado, para o qual exerce a sua profissão, e é tendo esse homem em atenção, e o que lhe é vantajoso e conveniente, que diz o que diz e faz tudo quanto faz (PLATÃO, República, I, 340b).
Neste ponto esclarecido que a definição de justiça dada por Trasímaco havia se voltado ao contrário, uma vez que do confronto entre as duas possibilidades, ou o governante não é sábio, erra e neste caso não faz o que lhe é conveniente; ou é sábio, não erra, e propriamente por isso não faz o que lhe convém, mas o conveniente aos outros (pois quem conhece o bem não pode fazer o mal), só resta à consequência de que o governante justo não faz apenas o que lhe é conveniente, mas aquilo que convém aos súditos, estes por sua vez, obedecendo às leis colaboram com o bem e o progresso da comunidade (PLATÃO, República, I, 343a).
Depois deste discurso, Trasímaco queria retirar-se, mas não lhe permitiram. Do discurso de Trasímaco surgirá uma nova questão: que o injusto seja mais feliz que o justo. Principalmente a partir do livro II (República) que é flagrante a alternância do discurso de Trasímaco, que passará a utilizar os termos justo e injusto em seu significado tradicional, ou seja, como a justa medida nas relações. Portanto, Sócrates, não o refuta no mesmo campo em que levantou a questão, em outras palavras, Sócrates não elenca uma série de situações demonstradas pela experiência em que o justo leva vantagem sobre o injusto.
Ele continuará a lógica de seu argumento, penetrando no ponto central da questão: entre a justiça e a injustiça, qual é a virtude e qual o vício? Ou seja, qual é conforme a lei moral? Contudo, das premissas de Trasímaco não era possível outra conclusão: a injustiça é virtude e sabedoria e a justiça vício e ignorância. Trasímaco é obrigado pela lógica de seu raciocínio a inverter a ordem moral tradicional. Sócrates não precisou de muitas intervenções para demonstrar que a verdade é o contrário: "logo, o justo se revela como bom e sábio e o injusto como ignorante e mau". É o xeque-mate que faz Trasímaco corar. Porém Sócrates ainda demonstra que o completamente injusto não existe, porque ao menos com seus companheiros de injustiça deverá ser justo, de outro modo, os inteiramente injustos seriam incapazes de atuarem juntos (PLATÃO, República, II, 346a-347b).
Portanto, o homem injusto não pode viver melhor que o justo e ser mais feliz. Ainda uma argumentação: cada órgão tem sua atividade, que pode desempenhar por uma virtude que lhe é própria, assim, não se explica a atividade dos olhos pelo vício (que seria a cegueira). Também a alma tem sua atividade que desempenha por meio de uma virtude que lhe é própria: a justiça é a virtude da alma enquanto a injustiça seu vício. "Logo, a alma justa e o homem justo viverão bem, e o injusto mal... Então, o homem justo é feliz e o injusto é desgraçado". Terminando o discurso: "jamais a injustiça será mais vantajosa que a justiça, ó bem-aventurado Trasímaco". Logo, o injusto será também odioso aos deuses, ó Trasímaco e o justo será seu amigo (PLATÃO, República, I, 352a).
Glauco, não convencido pelos argumentos nem de Trasímaco nem de Sócrates, retoma a problemática. Como habitualmente escuta pessoas defendendo ideias como as de Trasímaco, quer ouvir de Sócrates um convincente discurso em favor da justiça. Propõe-se metodologicamente retomar as opiniões comuns e defender a injustiça. Distingue os bens em três categorias: primeiro aqueles estimados em si mesmos; segundo, aqueles que se desejam por si mesmos e por seus efeitos, como a vista, a saúde; por fim, aqueles que não se deseja por si mesmos mas somente pelos seus efeitos, como a ginástica e o tratamento das doenças. Embora para Sócrates a justiça seja um bem da segunda espécie, ou seja, desejada em si mesma e pelas suas consequências, a maioria das pessoas são de opinião de que ela pertença à terceira espécie, ou seja, "pertence à espécie penosa, a que se pratica por causa das aparências, em vista do salário e da reputação, mas por si mesma se deve evitar, como sendo dificultosa" (PLATÃO, República, III, 386a).
Assim, se é justo por incapacidade de cometer injustiça, logo, a justiça não é estimada por si mesma, mas é necessariamente praticada pelos incapazes, vale dizer, pelos mais fracos. Ilustração disso é a história de Giges com o anel mágico. Se dois homens, um tido por justo e outro por injusto, tivessem a mesma oportunidade, os dois seriam injustos. Conclui-se "que ninguém é justo por sua vontade, mas constrangido, por entender que a justiça não é um bem para si, individualmente, uma vez que, quando cada um julgar que lhe é possível cometer injustiças, comete-as. Efetivamente, todos os homens acreditam que lhes é muito mais vantajoso individualmente, a injustiça do que a justiça". Glauco ainda retoma numa série de exemplos a tese já apresentada por Trasímaco de que a vida daquele que é perfeitamente injusto (a perfeita injustiça segundo Glauco é ser injusto e parecer justo) é muito mais feliz da que a do justo, que não se importa com a aparência, mas com a realidade (PLATÃO, República, II, 362a-363a).
Terminada a argumentação de Glauco, Adimanto, seu irmão, a reforça. No processo educacional se ensina ajustiça, não como um bem em si mesmo, mas pelas vantagens que trás, ou seja, aquele que aparenta ser justo é feliz: "os pais apregoam e recomendam aos filhos, bem como todos aqueles que têm alguém a seu cargo, a necessidade de ser justo, sem elogiarem a coisa em si, a justiça, mas o bom nome que dela advém, a fim de que aquele que parece ser justo receba desta fama magistraturas e quantas outras vantagens...e que o justo tem, devido à sua reputação". Retomando os dizeres de leigos e poetas, profetas da divindade, demonstra que o injusto não tem nem mesmo que se preocupar com uma vida no além, pós-morte, já que com o fruto de suas injustiças poderá oferecer sacrifícios aos deuses e ainda granjear, além do perdão, outras vantagens:
Efetivamente, se formos justos, só estaremos livres de castigo por parte dos deuses, mas afastaríamos assim os lucros provenientes da injustiça. Ao passo que, na qualidade de homens injustos, não só teremos lucros como também, se houvermos feito transgressões e cometido faltas, por meio das nossas preces os persuadiremos a deixarem-nos escapar incólumes (PLATÃO, República, III, 387a).
No entanto, Sócrates lembra a dificuldade da empresa – responder a todos os detratores da justiça - mas não pode deixar de fazê-lo, o que seria "impiedade". Para tanto estabelece uma analogia, analisá-la primeiro numa macroestrutura (estado) e com isso iluminar a microestrutura (indivíduo): "entendo que devemos conduzir a investigação da mesma forma que o faríamos, se alguém mandasse ler de longe letras pequenas a pessoas de vista fraca, e então alguma delas desse conta de que existiam as mesmas letras em qualquer outra parte, em tamanho maior e numa escala mais ampla". Como a justiça que existe no indivíduo deve existir também no estado "talvez exista uma justiça numa escala mais ampla, e mais fácil de aprender".
Contudo, estabelecida esta analogia, Sócrates, inicia a construção de um estado imaginário, onde deve se revelar a justiça. Começa explicando a origem do estado: porque ninguém é autossuficiente, mas tem necessidade de muita coisa. Assim, os indivíduos se unem para resolverem suas necessidades de alimento, habitação e coisas do gênero. Também logo se nota que todo homem é diferente um do outro, ou seja, possuem "naturezas diferentes, cada um para a execução de sua tarefa". Cada um nasce com determinadas qualidades, habilidade para executar um trabalho, e é isto que sempre deverá fazer, especializando-se: "o resultado é mais rico, mais belo e mais fácil, quando cada pessoa fizer uma só coisa, de acordo com a sua natureza e na ocasião própria, deixando em paz as outras".
Uma pessoa desempenhando uma só arte, aquela que condiz com sua natureza, poderá atingir nela a perfeição, o que não é possível para quem desempenham diversas. Este princípio de especialização funcional tem uma importância decisiva na teoria do estado platônico. Embora sua justificação que por primeiro salta aos olhos seja de caráter pragmático, isto é, que com a divisão de trabalho e consequente especialização aumentam-se a eficácia e o rendimento, Platão a fundamenta em um princípio ontológico, ou seja, na natureza mesma das pessoas ou instituições. Será a partir deste eixo que Platão construirá seu estado e que determinará sua definição de justiça.
Aplicando, portanto, este princípio, aparece os estados platônico constituídos dos mais diversos artesãos ou operários (camponeses, sapateiros, padeiros, pedreiros, comerciantes, navegantes, etc.). Com a sofisticação do bem-estar, é necessário também ampliar o território, possível somente com a guerra, que tem aí sua origem. E com a guerra surge a necessidade de preparar homens para este trabalho. Logo, à classe dos operários deve se unir uma nova classe, a dos guerreiros. Já que cada um deverá desenvolver unicamente a arte com a qual condiz sua natureza, também para guerreiros se deverão escolher aqueles "de qualidades e natureza apropriadas para a custódia da cidade". Seu modelo é o cão de boa raça, brando com os conhecidos e feroz com os estranhos.
É ressaltada por Platão a necessidade do elemento intelectual, o "conhecimento", que permitirá identificar os amigos e os inimigos. O guardião deve ser dotado, portanto, além do instinto agressivo, de uma atitude filosófica. Platão analisa ainda longamente como devem ser educados e treinados para o desempenho de sua função. E por fim se constitui a terceira classe, a dos governantes. Grupo reduzido de homens capazes para governar que sairão de entre os melhores guardiões. Como para os guerreiros, também para os governantes se exige dotes e educação adequada.
Tendo construído imaginariamente a cidade, Sócrates deverá evidenciar nela a justiça. Propõe a seguinte metodologia: se a cidade tem bons fundamentos deve também ser absolutamente boa e, portanto, será sapiente, corajosa, temperante e justa. Ora, bastará proceder por via de exclusão: quando na cidade se tiver identificado às três primeiras a que restar será a justiça. O que torna uma cidade sábia é a ciência da vigilância, ou seja, dos chefes que são os guardiões perfeito se em número reduzidíssimo. A coragem é o conhecimento daquilo que deve ser temido e daquilo que não deve ser temido.
Tendo determinado o que são e onde se encontram as primeiras três virtudes se conclui também quanto à justiça: é o próprio princípio que se estabeleceu como fundamento da cidade, ou seja, "executar a tarefa própria, e não se meter nas dos outros". Concisamente, Sócrates define a justiça como o "desempenhar cada um a sua tarefa". Assim, a construção do estado ideal constituído de três classes com função específica a cada uma, desemboca na concepção da justiça como cumprimento adequado do princípio de especialização. Cada um é dotado naturalmente para desenvolver determinada tarefa, deve desenvolvê-la e somente a ela, alcançando a perfeição naquilo que faz. A justiça assume assim um caráter generalíssimo. É ela quem dá às outras virtudes - sabedoria, coragem e temperança – a força para se constituírem, e, uma vez constituída, as preserva enquanto se mantém nelas. Certamente esta forma de entender a justiça tem alguma novidade própria de Platão, mas não deixa de estar em conformidade com a grande tradição grega (PLATÃO, República, III, 389c).
Definida e localizada a justiça na cidade, transfere-se a aplicação do princípio para o indivíduo, se também no indivíduo ele se revelar, estará confirmado em sua legitimidade, porque "o homem justo, no que respeita à noção de justiça, nada diferirá da cidade justa, mas será semelhante a ela". Sendo assim, também a alma deverá se revelar constituída de três partes: "porventura não é absolutamente forçoso que concordemos que em cada um de nós estão presentes as mesmas partes e caracteres que na cidade?".
A alma humana, portanto, é constituída de três elementos: o racional, o irascível e o concupiscível, o que faz com que o indivíduo seja sábio, corajoso e temperante. Aplicando o princípio da justiça ao indivíduo cada uma destas partes deverá desempenhar sua tarefa: à razão compete governar; à parte irascível, conforme à qual o indivíduo é corajoso, cabe preservar "em meio de penas e prazeres, as instruções fornecidas pela razão sobre o que é temível ou não"; e será o indivíduo temperante" devido à amizade e harmonia desses elementos, quando o governante e os dois governados concordam em que é a razão quem deve governar e não se revoltam contra ela".  Pelo contrário a injustiça será "uma sedição dos elementos da alma, que são três, uma intriga, uma ingerência no alheio, e uma sublevação de uma parte contra o todo, a fim de exercer nela o poder, sem lhe pertencer" (PLATÃO, República, IV, 436a).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente produção teve como objetivo, trabalhar o tema “A cidade justa na República de Platão”, todavia foi pesquisado minuciosamente, o livro a República, sua definição de justiça e os caminhos para a formação da cidade ideal no pensamento do filósofo ateniense (Platão). Por conseguinte, para somar conhecimentos objetivos das ideias deste pensador, foi necessário haver um diálogo com algumas de suas obras. Sabe-se que no primeiro capítulo tratou-se sobre a concepção de alma para Platão e suas implicações para a teoria política; e dentro desta, existe teorias sobre a justiça na construção do estado ideal, tentativas de educar Dionísio II para formar o governo justo em Siracura.
Para tanto, sabemos que a obra questionada exibe o ponto segundo do projeto político de Platão: a cidade justa (ideal). Assim, o diálogo proferido por Sócrates, Polemarco, Trasímaco e Glaucon e outros, na casa de Céfalo, iniciou-se, aparentemente, sem muita pretensão, ou seja, sem superar as ideais da justiça, porém, ganha lentamente seu espaço e encontra os rumos do barquejo dos caminhos para realização da cidade perfeita (Ideal). No capítulo seguinte (capitulo II) foram discutidas as ideias sobre a justiça e do bem em Platão, educação e valores da cidadania, e por fim, a justiça na República de Platão.
Contudo, o sentimento de justiça é, pois, a virtude maior cujo valor ético guia as condutas dos homens. Para que esta virtude seja alcançada, o homem deve buscar o bem em si mesmo, porque ele realiza o ideal de justiça, tanto com relação ao bem individual quanto social. Frisamos que ética platônica ocupa-se com o correto modo de agir e sua relação com o alcance da felicidade. Não obstante, o discurso ético apresentado na República acerca da felicidade relaciona esta com o conceito de justiça.
Os momentos fundamentais na República de Platão: a justiça e a cidade ideal. No entanto, nesta trajetória discutimos o conceito claro e objetivo de justiça através dos escritos do filósofo, assim como, dos seus amigos que fizeram comentários, buscando a compreensão dos diagnósticos dos interlocutores do filósofo Sócrates, o personagem mais citado no diálogo.
Então, passamos a uma análise da formação do indivíduo na cidade justa (Ideal), pois o caminho educativo é uma das maneiras principais para construção da sociedade da cidade (polís), realizada no livro do autor. Não podemos esquecer que a teoria da justiça está na cidade justa (Ideal) do filósofo construtor da academia, “Academia de Atenas”, onde é provável chegar, através de uma educação de qualidade a conduzir os homens à compreensão e aceitação de sua conditio perante o grupo social e a cidade construida por esse grupo.
Os gregos foram os pioneiros que pensaram na condição individual do homem em relação ao grupo social e, ao que se sabe, essa experiência foi aos poucos sendo desfeita pelos atenienses, pelo motivo do pensamento único que os afastavam do agrupamento denominado polís. No mais, exemplos mais duráveis do vinculo indivíduo-cidade foi a do espartano que, tudo aponta, inspirou Platão quando ele concebeu a cidade ideal. Esparta manteve-se em conexão em torno da noção de estado por muito tempo, mais tempo que Atenas. Não obstante, a cidade ideal de Platão teria que somar com uma unidade social e uma fortaleza humana que jamais poderiam correr risco de desvirtuamento. Logo, foi necessário ter uma discussão a cerca de um dos elementos mais importantes da paidéia ateniense: a poesia. Porém, esta, foi motivo de críticas pelo filósofo Platão.
A pólis Ideal não poderia contar com as ideias dos poetas trágicos e seus escritos, por causada possível marca que deixariam nas crianças e nos jovens que conhecessem as histórias de fragilidades humanas e divinas. Sendo assim, a força era atributo de estrema importância para a educação do cidadão ideal, também construtor da cidade justa (ideal), que a manteria funcionando em perfeição. No entanto, o pensador (Platão) atestou a impossibilidade de atingir a condição ideal por ele, de perfeita eudaimonia. A contribuição da República se deu não somente para o legado histórico da civilização grega, porém, sobretudo para a ampliação da filosofia que a integra. Sua contribuição é relativamente incontestável também para os futuros pensadores ao ateniense e para toda a formulação política, social, jurídica e ética do mundo contemporâneo evidente. Contudo, as raízes da filosofia política e da ética estão nos escritos de Platão, quer estejamos em concordância com eles, ou em discordância.


REFERENCIAS

BERGSON, Henri. Cursos sobre a filosofia grega. Tradução: Bento Prado Neto, São Paulo: Martins Fonte 2005.

HUISMAN, Denis. Dicionário dos Filósofos. Tradução: Cláudia Berliner, Eduardo Brandão, Ivone Castilho Benedetti e Maria Ermantina de Almeida Prado Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

______. Os diálogos de Platão: estrutura e método dialético. Tradução: Dion Davi Macedo. São Paulo: Edições Loyola, 2002.

PLATAO. A República. Introdução, Tradução do grego e notas: Maria Helena da Rocha Pereira. Editora: J. Burnet. Platonis Opera T.IV Oxonii e Typographeo Clarendoniano, 1949.

PLATÃO. Carta VII. Tradução do grego e notas: José Trindade Santos e Juvino Maia Jr. Rio de Janeiro: Editora PUC-Rio; São Paulo: Loyola, 2008.

PLATÃO. A República. 7. ed. Trad. Maria Helena da Rocha Pereira. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1993.____. Cartas. Trad. Carlos Alberto Nunes. Belém: Universidade do Pará, 1980. Vol V.

____. Marginalia Platônica. Introdução. A Carta Sétima. Trad. Carlos Alberto Nunes. Belém: Universidade do Pará, 1973.

2 comentários:

  1. Nossa estou boque aberta que fascinante historia a Republica,fala sobre tudo um pouco e sobre as tres partes da alma...sensacional,meus parabens

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  2. Tudo bem escrito e bem detalhado com referencias...realmnte vc tem um dom...

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